GTec - Newsletter - 21.04
Newsletter quinzenal do Grupo de Estudos em Filosofia e História da Técnica
Olá, pessoal, esta é a mais nova edição da newsletter do GTec. Nela, divulgaremos o nosso próximo encontro e falaremos de gênero, computação e história da internet, além de abordar o legado do CCRU, contracultura e cibercultura, trabalho e economia, racismo e um aceno ao Chthuluceno ao final da nova edição.
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Próximo encontro
Nosso próximo encontro acontecerá na quarta-feira, 28/04, às 18h. O evento já foi criado no Facebook e está disponível no seguinte link. Lembrando que o link da reunião estará disponível no site da APPH logo antes do início do encontro.
Conforme avançam as reuniões, nos encontramos mais próximos de finalizar a leitura conjunta do livro Do modo de existência dos objetos técnicos, de Gilbert Simondon. Tem sido uma jornada muito significativa compartilhar a leitura de um livro tão rico de possibilidades com os colegas que compõe o GTec.
No nosso próximo encontro, leremos o capítulo “Pensamento técnico e pensamento filosófico”, no qual o filósofo francês reforça a importância da filosofia para o estabelecimento de uma relação mais apropriada com a técnica. No capítulo, Simondon conclui o percurso de sua argumentação, voltando a unificar cultura técnica e cultura filosófica.
O capítulo está disponível na pasta do GTec no Google Drive, assim como o restante do livro. Para quem puder e/ou tiver interesse, recomendamos também encomendar o livro na apurada edição da Contraponto, que vende pelo seu site com desconto e frete grátis.
Cybernetic Culture Research Unit
O variado legado do Cybernetic Culture Research Unit (CCRU), grupo de intelectuais do qual fizeram parte Sadie Plant, nossa leitura do último encontro, e outros pensadores contemporâneos, como Nick Land e Kodwo Eshun, foi tema da nossa reunião.
O CCRU estabeleceu uma herança complexa. De um lado, ajudou a aproximar a filosofia da cultura pop e aprofundou o impacto dos estudos culturais ingleses, já representados por Stuart Hall. De outro lado, abriu espaço para a emergência de visões proto-fascistas ou reacionárias do aceleracionismo, representadas por Nick Land. Sua reunião entre reflexão filosófica e produção cultural foi pioneira, mas as consequências políticas de sua teorização são incertas.
Para quem tiver interesse em explorar a produção feita pelo grupo, fica a indicação da coletânea Writings 1997-2003, que contém textos representativos da produção intelectual do CCRU. Também disponibilizamos a coletânea - livreto? libelo? - Digital Hyperstition, editada pelo grupo em 1997 com escritos colaborativos de seus membros.
Também mencionamos a obra de Mark Fisher, mais conhecido pela expressão - e livro - “realismo capitalista”, mas que começou sua carreira no CCRU. Nosso colega Rafael Moscardi Pedroso disponibilizou o .pdf da tese apresentada por Fisher na Universidade de Warwick, onde estava sediado o grupo. Intitulada “Flatine Constructs: Gothic Materialism and Cybernetic Theory-Fiction”, a tese busca levar a cibernética ao limite, explorando suas oposições entre livre arbítrio e determinismo, vitalismo e mecanização, tomando como objeto o que Fisher chama de “materialismo gótico”, um plano da imanência a partir do qual tudo parece perder a vida.
Mulheres na história da computação
O último encontro, dedicado ao ciberfeminismo, não poderia de levantar a questão do lugar das mulheres na história da computação, sobretudo após o destaque à figura de Ada Lovelace (1815-1852), considerada precursora da programação.
De fato, o lugar das programadoras nos primórdios da computação foi simultaneamente reconhecido e negligenciado. A primeira linguagem de programação moderna, o COBOL, foi desenvolvida por Grace Murray Hopper (1906-1992), enquanto as “computadoras” durante muito tempo foram mulheres encarregadas de executar os programas, o que envolvia frequentemente o trabalho físico de alterar os circuitos elétricos para fazê-los funcionar. Reconhecido e negligenciado, o papel das mulheres muitas vezes esteve associado ao software, contrastado com o hardware, que ocuparia o polo masculino e representaria o principal elemento de funcionamento do computador.
Não é preciso dizer que muito mudou desde então, embora a presença das mulheres na computação seja ainda uma política a ser estimulada, além de um tema a ser melhor explorado pela bibliografia.
Duas referências sobre o assunto são os livros Recoding Gender, de Janet Abbate, e Broad Band, de Claire L. Evans. Os dois livros reavaliam a história das mulheres na computação, buscando tanto as pioneiras no campo quanto debatendo as limitações para sua participação na área.
Com relação a isso, vale a pena também explorar a relação entre o desenvolvimento da internet e a contracultura dos anos 1960. Sobre o assunto, acrescentamos na pasta do GTec os livros From Counterculture to Cyberculture, de Fred Turner, e What the Dormouse Said: How the Sixties Counterculture Shaped the Personal Computer Industry, de John Markoff. Os dois livros tratam da relação entre contracultura e o desenvolvimento da internet, destacando o papel do Whole Earth Catalogue nessa passagem.
Para uma chave diferente no estudo da internet, fica também a indicação de The Closed World, livro de Paul N. Edwards sobre a relação entre o desenvolvimento da internet e a Guerra Fria, o outro componente, junto da contracultura, a moldar o desenvolvimento da internet e da computação como a conhecemos hoje. Lembrando que a própria Janet Abbate tem um livro já clássico sobre a invenção da internet.
Outras referências
No último encontro, tivemos a oportunidade de ler um dos trabalhos de Lisa Nakamura explorando a relação entre tecnologia, indústria e a mobilização de mulheres navajo enquanto trabalhadoras. Nakamura é professora na Universidade do Michigan, nos Estados Unidos, e especializada no tema da reconfiguração da raça no ambiente digital contemporâneo. Na pasta do GTec, acrescentamos outras obras da autora, como Digitizing Race: Visual Cultures of the Internet, editada em 2008, e duas coletâneas que ela ajudou a organizar, Race in Cyberspace e Race After the Internet.
As últimas semanas também reacenderam o debate sobre raça e as infraestruturas da internet. Um dos motivos é uma matéria do New York Times detalhando os esforços de pesquisadores e ativistas para remover termos racistas da computação, como master e slave, utilizados na programação. Também chamou a atenção que o YouTube bloqueou o uso do Black Lives Matter como tema no direcionamento de propagandas, efetivamente diminuindo o alcance de vídeos sobre a temática da luta antirracista frente a vídeos com perspectivas supremacistas brancas e racistas. O debate é importante por revelar como funcionam as plataformas online no seu interior.
Praticamente já passou, mas vale a pena procurar e rever os vídeos das intervenções que compuseram o seminário Histories of AI: Imaginaries and Materialities, promovido pelo DigiLabour, da Unisinos. Foram dois dias de discussão, entre 19 e 20 de abril, que contaram com diversos nomes relevantes dos estudos sobre tecnologia, incluindo a própria Janet Abbate, além de Jonathan Sterne, já citado nessa newsletter. Do lado brasileiro, destaque para a participação de Gustavo Daudt Fischer, Mariana Valenta e Adriana Amaral em mesas que abordaram o imaginário da inteligência artificial, gênero e computação e música e culturas auditivas. Os dois dias de discussão estão disponíveis no canal do grupo no YouTube aqui e aqui.
O tema do trabalho nunca escapa às nossas reuniões. Por esse motivo, fica também a indicação do livro Savage Economics: Wealth, Poverty, and the Temporal Walls of Capitalism, de David Blaney e Naeem Inayatullah, que repensa a disciplina da economia a partir do debate pós-colonial desnaturalizando seus termos, ao mesmo tempo que repensando a relação entre centro e periferia.
De alguma forma relacionado a isso, fica a dica da resenha de Sophie Lewis sobre o livro Staying With the Trouble, de Donna Haraway. Polêmica e corajosa, a resenha lamenta o que Lewis afirma ser as tendências proto-fascistas ocultas na adoção do making kin, not babies defendido por Haraway.
Por fim, normalmente não uso este espaço para auto-promoção, mas queria aproveitar para divulgar o curso NFTs: três histórias entre arte, mercadoria e mídia que ministrarei na BICA Plataforma, espaço online criado recentemente pelas artistas Thais Graciotti e Patricia Stagi. O objetivo do curso é abrir a caixa de problemas levantados pelas NFTs para além das críticas habituais à especulação financeira e de seus impactos ambientais, buscando resgatar seu potencial de empoderamento para artistas, assim como suas limitações decorrentes da vinculação entre arte e propriedade. Inserindo as NFTs em três "contrahistórias” da arte, do mercado e das tecnologias, o curso pretende oferecer uma visão ampla, contraditória e aprofundada dos dilemas das NFTs. Inscrições e maiores informações no site da BICA Plataforma.
Coreografia One Flat Thing, de William Forsythe (2008), tratada por Erin Manning como exemplo da apropriação da obra de Gilbert Simondon no campo da dança. Para saber mais, vale a pena conhecer a obra da filósofa e coreógrafa norte-americana, que tem feito o importante trabalho de conectar a dança e a filosofia contemporâneas. Seu Always More Than One: Individuation's Dance, está disponível na pasta do GTec no Google Drive.
Essa foi a nova edição da newsletter do GTec. Compartilhe, divulgue e se inscreva para receber nossas novidades. A newsletter é enviada quinzenalmente.
Lembrando que o GTec é uma atividade apoiada pela Associação de Pesquisas e Práticas em Humanidades, com sede em Porto Alegre e ramificações por todos os lugares que a internet alcança. É uma organização sem fins lucrativos, mantida apenas pelo trabalho dos colaboradores e pelas atividades realizadas nela. Por esse motivo, se você puder, apoie a APPH através da conta do apoia.se/apph